Tive o máximo privilégio de ser seu aluno e aprender com
ele este gosto do anuncio do Evangelho aos jovens.Uma das frases basilares de
todo o seu pensamento acerca da pastoral juvenil era "Eu vim para que
tenham vida... e a tenham em abundância". Ainda me lembro como se fosse
hoje!
Não esqueço o entusiasmo com que falava dos jovens e a preocupação pelo anuncio
da Palavra... sobretudo a sua confiança no método da narração aplicado aos
Evangelhos!Por isso decidi partilhar convosco uma das suas narrações do seu
livro "Trenta storie" (ELLEDICI, 1999) e que já usei algumas vezes em
actividades com jovens.
É uma narração inspirada no texto de Lucas dos discípulos
de Emaús (Lc 24,13-35).
Este é o meu simples e humilde tributo a um tão grande
mentor da Pastoral Juvenil!
Estavam cheios de expectativas.
Tinham aceite o convite de Jesus com tanto entusiasmo. Tinham deixado tudo
para segui-lo, fascinados que estavam pela sua pessoa e pela sua causa.
Agora parece que tudo acabou. No
pior dos modos.
Os inimigos tinham capturado
Jesus. Tinham-no submetido a um julgamento irrisório. Condenaram-no como um
malfeitor, àquele que tinha feito somente bem aos que encontrava. E depois de o
terem torturado, mataram-no. Tudo acabou deste modo. Jesus tinha prometido que
venceria até a morte. Tinha restituído a vida aos outros. Porém com a sua...
nada disso aconteceu. Jesus tinha desaparecido do olhar e do coração dos seus
amigos. Os inimigos tinham vencido. Tudo voltaria ao princípio.
Paciência... foi um sonho bonito,
que acabou muito depressa e de uma forma trágica.
Agora não havia mais nada a
fazer. Era necessário voltar para casa, com amargura da saudade e um pouco
envergonhados. Era necessário retomar o trabalho, abandonado há alguns meses.
Voltar... ao que era antes: como
se nada tivesse acontecido, suportando o sorriso gozão dos amigos, que não
tinham percebido aquela estranha vontade de seguir aquele tipo de Nazaré, que
fazia um bom número de inimigos com as suas ideias.
Muitos dos discípulos já tinham
regressado. Agora era a sua vez. Muito serenamente, decidiram voltar a Emaús, à
sua casa. Como se nada tivesse acontecido.
Caminhavam trocando entre si
palavra amargas. Não tinham outras: as últimas tinham sido gastas na triste
saudação aos amigos que ficaram em Jerusalém.
De repente, aproxima-se um
peregrino, saído do nada. Vinha, tal como eles, de Jerusalém. Mas ainda não se
tinham apercebido da sua presença.
“Boa noite. Salve. Para onde
ides?”. “Vimos de Jerusalém e voltamos para casa, em Emaús. Já falta pouco,
sorte a nossa”.
Insiste o peregrino: “Posso
juntar-me a vós? Eu vou para esses lados. A estrada é longa e, nos tempos que
correm, também é perigosa. Posso fazer-vos companhia?”.
“Que cara triste que tendes.
Parece que saíram de um funeral. Estarei enganado?”
A resposta é imediata. As
palavras saem como um choro. “De verdade vimos de um funeral. Falado em toda a
Jerusalém. Como é que não soubeste? Mataram Jesus de Nazaré. Era nosso amigo e
mestre. Estávamos com ele, partilhávamos a sua paixão pela libertação de Israel
e a sua esperança no futuro de Deus. Mataram-no, pregando-o numa cruz, com um
processo que parecia estar cozinhado para o condenar”.
Uma pausa para respirar e voltar
às últimas chamas daquela esperança que lhes tinha incendiado o coração.
“Só fazia o bem: curava os
doentes, tratava bem os pobres, tinha uma palavra de conforto até com os
pecadores. E vê lá que até ressuscitou mortos. De certeza que ouviste falar de
Lázaro, aquele de Betânia. Jesus trouxe-o à vida, três dias após a sua morte.
Infelizmente falava com excessivo à vontade de Deus e da lei. Queria muito bem
aos pobres.
Mataram-no. Quem? De certeza que
sabes... os romanos, mas com a cumplicidade dos nossos sacerdotes e doutores da
lei...
Antes de morrer, prometera que
voltaria a viver, também ele, como o seu amigo Lázaro. Mas já passaram três
dias... e nada.”
O segundo acrescenta: “Nada...
não é bem assim. Sabes, no nosso grupo tínhamos também algumas mulheres.
Estavam connosco para servir Jesus. Algumas dizem ter visto Jesus ressuscitado.
Ninguém acredita. São mulheres fanáticas... Imaginaram, cegas que estão pela
dor e o amor.
Os chefes, Pedro e os outros, não
viram nada.
Acabou. Também nós voltamos para
casa”.
“Calma. Não tireis conclusões
precipitadas”, toma a palavra o estranho companheiro de viagem. “Estais fazendo
uma leitura incorrecta dos acontecimentos. Estais a acreditar somente no que
vistes com os vossos olhos. Tenho pena de vós: sois um pouco cegos. Não sabeis
ler os mais profundamente os acontecimentos!”
“Ajuda-nos... se é que
consegues”. “Com muito gosto. Escutai”.
Passo a passo aproximavam-se do
seu destino. Passo a passo, o companheiro de viagem ajudava-os a reler os
acontecimentos. Cita passagens da escritura. Recorda profecias antigas e novas.
Actualiza antigas recordações.
Nem mesmo no tempo em que estavam
com Jesus, tinham vivido uma experiência tal. Estavam a ser projectados para o
futuro. Quase que tinham esquecido o passado. O presente e os seus projectos
eram mais importantes que o passado.
Agora, por outro lado, vêm o
passado à luz do presente. As coisas maravilhosas que Deus fez pelo seu povo
tornam-se uma espécie de nova leitura do presente. Mesmo a escuridão, a
incerteza e a dor mudam de tonalidade. Brilham com algo que nunca tinham
descoberto.
Olham-se. “Estranho... mas então
não mataram a nossa esperança. Somente a apagaram. Tentaram apagá-la e caímos
na armadilha. Sem passado o nosso presente torna-se desespero. Voltávamos para
casa porque não tínhamos futuro. Porém... há uma esperança. Jesus tinha razão
quando nos falava da semente que deve morrer para se tornar uma espiga”.
“Mataram-no... mas não venceram.
Deus vence a morte. Estava tudo programado nos planos de Deus”.
De um modo espontâneo começaram a
rezar salmos. Tinham um novo sabor. Nunca se tinham apercebido disso antes.
“E se voltássemos a Jerusalém?”.
“Amanhã. Hoje já é tarde. Não podemos fazer este caminho de noite. É muito
perigoso. Amanhã.”
Avistavam-se as primeiras casas de
Emaús. Tinham chegado ao seu destino: amanhã de manhã, ao nascer do sol, voltam
a Jerusalém.
O companheiro de viagem faz que
os saúda para pôr-se a caminho. “Continuas a tua viagem? A esta hora?”.
Insistem: “Fica connosco. A nossa casa tem lugar também para ti, sem problemas.
Vá lá... descansa”.
Estavam resignados a voltar à
vida de antes. Tinham já colocado os remos na barca, sem coragem e desiludidos.
Mas a experiência de Jesus tinha-os marcado profundamente. Respiravam a
exigência da hospitalidade, a verdadeira hospitalidade. As suas não eram
palavras de circunstância. Vinham do coração. “Fica connosco. És nosso
hóspede”.
O misterioso viajante pára.
Resiste, talvez para experimentar a autenticidade daquele convite. Depois pára.
Aceita o acto de hospitalidade.
Põem-se à mesa.
A certa altura... se lhe abrem os
olhos.
Jesus caminhou com eles. Rezou
com eles, ajudando-os a reler os acontecimentos do mistério que traziam em si.
Ajudou-os a rezar contemplando.
Agora a oração explode na
celebração. Jesus toma o pão e o vinho. Abençoa-os e partilha.
Um grito: “É ele, o crucificado
ressuscitou. Será possível que não nos tenhamos apercebido antes? Estávamos
mesmo cegos, de dor e resignação”.
Já não está. Voltou
silenciosamente tal como tinha vindo.
As poucas horas passadas com eles
marcaram-nos. Guiou-os pela mão numa intensa experiência de oração, que os
transformou profundamente.
A esperança e a paixão voltam aos
seus corações. A oração e a celebração se abrem para a vida.
Agora já não é tarde para voltar
a Jerusalém. Os perigos da viagem nocturna desapareceram. Partem,
apressadamente: a experiência vivida tem de ser comunicada aos outros.
Voltam a Jerusalém, para gritar a
todos: Jesus Ressuscitou, a sua aventura em favor da vida e esperança de
todos... continua. Ou melhor: recomeça.