Dos Sermões de São Gregório de Nazianzo, bispo
(Oratio 14, De pauperum amore, 23-24:PG35 889-890) (Séc.IV)
Manifestemos uns para com os outros a bondade
do Senhor
Considera de onde te vem a existência, a respiração, a inteligência, a
sabedoria, e, acima de tudo, o conhecimento de Deus, a esperança do reino dos
céus e a contemplação da glória que, no tempo
presente, é ainda imperfeita como num espelho e em enigma, mas que um dia
haverá de ser mais plena e mais pura. Considera de onde te vem a graça de seres
filho de Deus, herdeiro com Cristo e, falando com mais ousadia, de teres também
sido elevado à condição divina. De onde e de quem vem tudo isso?
Ou ainda, – se quisermos falar de coisas menos importantes e que podemos
ver com os nossos olhos – quem te concedeu a felicidade de contemplar a beleza
do céu, o curso do sol, a órbita da lua, a multidão dos astros e aquela
harmonia e ordem que se manifestam em tudo isso como uma lira afinada?
Quem te deu as chuvas, as lavouras, os alimentos, as artes, a morada, as
leis, a sociedade, a vida tranquila e civilizada, a amizade e a alegria da vida
familiar?
De onde te vem poderes dispor dos animais, os domésticos para teu serviço e
os outros para teu alimento?
Quem te constituiu senhor e rei de todas as coisas que há na face da terra?
E, porque não é possível enumerar uma a uma todas as coisas, pergunto
finalmente: quem deu ao homem tudo aquilo que o torna superior a todos os
outros seres vivos?
Porventura não foi Deus? Pois bem, agora, o que ele te pede em compensação
por tudo, e acima de tudo, não é o teu amor para com ele e para com o próximo?
Sendo tantos e tão grandes os dons que recebemos ou esperamos dele, não nos envergonharemos
de não lhe oferecer nem mesmo esta única retribuição que pede, isto é, o amor?
E se ele, embora sendo Deus e Senhor, não se envergonha de ser chamado nosso
Pai, poderíamos nós fechar o coração aos nossos irmãos?
De modo algum, meus irmãos e amigos, de modo algum sejamos maus
administradores dos bens que nos foram concedidos pela graça divina, a fim de
não ouvirmos a repreensão de Pedro: “Envergonhai-vos, vós que vos apoderais do
que não é vosso; imitai a justiça de Deus e assim ninguém será pobre”.
Não nos preocupemos em acumular e conservar riquezas, enquanto outros
padecem necessidade, para não merecermos aquelas duras e ameaçadoras palavras
do profeta Amós:
Tomai cuidado, vós que andais dizendo: “Quando passará o mês para
vendermos; e o sábado, para abrirmos nossos celeiros?” (cf. Am 8,5).
Imitemos aquela excelsa e primeira lei de Deus, que faz chover sobre os
justos e os pecadores e faz o sol igualmente levantar-se para todos; que
oferece aos animais que vivem na terra a extensão dos campos, as fontes, os
rios e as florestas; que dá às aves a amplidão dos céus, e aos animais
aquáticos, a vastidão das águas; que proporciona a todos, liberalmente, os
meios necessários para a sua subsistência, sem
restrições, sem condições, sem fronteiras; que põe tudo em comum, à disposição
de todos eles, com abundância e generosidade, de modo que nada falte a ninguém.
Assim procede Deus para com as suas criaturas, a fim de conceder a cada um os bens
de que necessita segundo a sua natureza e dignidade, e manifestar a todos a
riqueza da sua bondade.
Reflexão pessoal
Se paramos para olhar o que existe à nossa volta, para contemplar
a beleza da criação, não podemos de deixar de reconhecer a bondade de Deus.
A natureza criada e o ser humano são um grande reflexo da
bondade de Deus, concedendo a cada um aquilo que necessita.
Deixemos que esse reflexo da bondade de Deus ilumine a
vida e o mundo de todos aqueles que quotidianamente se cruzam connosco.
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